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Entrevista com Bruno Moreira - 50 anos da Ditadura Militar

Nome: Bruno Moreira

 

Idade: 29 anos

 

Cidade natal: Salvador-BA

 

Onde trabalha e função: Professor de História do Instituto Federal da Bahia (IFBA) – Campus Santo Amaro, Coordenador da Área de Filosofia e Ciências Humanas do campus.

 

 

Grêmio Estudantil: É possível fazer um balanço do que foi o período do Regime Militar?

Bruno Moreira: Foi um período sombrio da História do Brasil. Interrompeu o exercício democrático que vinha amadurecendo no país desde o fim do Estado Novo, em 1945. Fez retroceder os movimentos sociais que se consolidavam no Brasil como agentes de transformação. Interrompeu a execução de reformas que vinham sendo construídas pelo governo golpeado, o de João Goulart. A ditadura foi a responsável por instituir um modelo pautado numa ideia de Segurança Nacional, a qual era usada para violações diversas dos direitos humanos. Foi um período em que o modelo de Estado autoritário passou a gerenciar o país e, neste aspecto, só foram atendidos os interesses das elites dominantes vinculadas ao projeto dos militares.

 

Grêmio Estudantil: Como, na sua avaliação, os historiadores do país tem se posicionado sobre esse período?

Bruno Moreira: Ao se falar “os historiadores”, denota-se uma totalidade que é difícil alcançar. Mas é possível dizer que já há inúmeros trabalhos acadêmicos que avaliaram com certa profundidade o período em diversos aspectos: as questões políticas e os interesses econômicos que marcaram o golpe civil-militar, os setores empresariais envolvidos, a participação dos Estados Unidos na preparação do golpe, a  luta contra a ditadura, as organizações clandestinas etc. Creio que esta produção historiográfica sobre o período já permite elaborar um panorama rico do que a ditadura representou e dos crimes por ela cometidos. Mas, evidentemente, os historiadores continuam com um desafio grandioso: o acesso aos documentos relativos à repressão. Houve muita destruição destes documentos. Apesar do esforço, ainda há muita dificuldade neste sentido.

Minha foto do Fala Bahia, onde sou colunista

A charge retrata a dificuldade de acesso aos documentos da ditadura militar.

Grêmio Estudantil: Esse momento histórico tem sido tratado de forma relevante nas escolas? O tema ainda é um tabu?

Bruno Moreira: Não o consideraria, hoje, um tabu. Acho que cada vez mais aumentam os esforços dos profissionais de História em discutir a questão e, principalmente, de acessar informações ainda tão difíceis sobre o período. Evidentemente, ainda há interesse por parte de alguns setores, de que certas discussões não sejam feitas. Isso acaba interferindo (não só nas escolas) para que algumas discussões tenham dificuldades de ser desenvolvidas e de certas informações de serem acessadas. Neste sentido, entendo que o trabalho da Comissão da Verdade deve, de algum modo, alcançar também as escolas. É o que esperamos. Que se produzam mais materiais didáticos sobre o período, por exemplo. A memória é nossa principal arma para que evitemos que tal modelo se repita. Achei, por exemplo, muito representativa a luta da comunidade escolar do antigo Colégio Emilio Garrastazu Médici, nome de um dos presidentes da ditadura (durante seu governo, foi decretado o AI-5), para mudar seu nome. Depois de votação, o nome escolhido para a escola foi o do baiano Carlos Marighella, corajoso opositor do regime militar, e que foi assassinado em São Paulo pela ditadura. Isto tem uma representatividade muito grande, pois você levanta discussões fundamentais no âmbito da escola, entre elas a da democracia.

 

 

Grêmio Estudantil: É possível traçar uma relação entre a resistência ao Regime Militar e as manifestações que ocorrem no país desde junho do ano passado? 

Bruno Moreira: As comparações são sempre delicadas por conta das particularidades de cada tempo histórico. Vivemos num momento político diferente, em que as instituições do regime democrático representativo, ainda que repleta de vícios e problemas muito sérios, estão em vigor.  As organizações que resistiam clandestinamente ao regime militar, diante de uma conjuntura de terror de Estado, tiveram que fazer opções difíceis como a de pegar em armas. É preciso localizar historicamente que o que demarca estas manifestações do ano passado são questões outras. Reclamam o aperfeiçoamento da democracia e sinalizam que há problemas já intoleráveis. Mas partem de condições diferentes. O diálogo que podemos travar entre estas diferentes conjunturas é a atenção para o fato de que a ferramenta da pressão popular, nas ruas, é sim uma estratégia relevante. Pode desencadear discussões no âmbito da sociedade acerca dos limites que o governo instituído e o modelo apresentado carregam. Mas, volto a dizer: as comparações em conjunturas tão distintas são muito perigosas e até equivocadas, correndo-se o risco de cometermos o que chamamos na história de anacronismo.

No ápice dos "anos de chumbo", Carlos Marighella foi considerado o inimigo número 1 da ditadura. Sua coragem e suas ideias inspiraram vários grupos de oposição ao regime.

Grêmio Estudantil: O que representa a criação Comissão da Verdade pela presidente Dilma? Qual a sua opinião sobre essa medida?

Bruno Moreira: É importante entender que outros países da América Latina que vivenciaram ditaduras no século XX já vinham construindo modelos de Comissões da Verdade já há algum tempo. Chile, Argentina, Uruguai, Peru, Bolívia, entre outros, podem ser citados neste sentido. No Brasil, a instalação de tal mecanismo tardou quase trinta anos depois do fim do período da ditadura militar. Esse atraso tem implicações. Muitas informações, depoentes e documentos ficaram no caminho. Por isso, o primeiro ponto a destacar é o da demora. Evidentemente, o fato dela ter sido instalado é um passo muito importante, porque ela tende a investigar casos de tortura, assassinatos e outros crimes cometidos pelo regime do período. Algumas famílias convivem até hoje com um silêncio do Estado sobre entes queridos desaparecidos naquela época, depois de serem capturados por agentes da repressão. Muitas pessoas tiveram suas vidas profundamente alteradas por conta do regime. Além disso, há inúmeros casos de violações dos direitos humanos que jamais foram trazidos à público. O Estado precisa sair do silêncio e garantir reparações.

 

 

Grêmio Estudantil: Recentemente aconteceu no Brasil a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade", que defende a volta da ditadura e relembra a marcha anticomunista e de apoio ao golpe militar realizada há 50 anos. Qual o reflexo disso no país? O senhor acredita na volta da ditadura?

Bruno Moreira: Vou começar pela última pergunta. Não acredito em “volta da ditadura”, uma vez que as condições históricas são completamente diferentes daquelas vivenciadas às vésperas do golpe civil-militar de 1964. A sociedade tem amadurecido politicamente. A ideia de um novo golpe à Constituição e a derrubada de um presidente eleito parece, neste sentido, longínqua. Também percebe-se claramente que os signos e os argumentos conservadores da direita brasileira já não encontram boa receptividade entre as pessoas. Nos anos 60, a propaganda anticomunista era um dos recursos dos que planejavam o golpe. Hoje, tal expediente, apesar de ainda presente, já não mobiliza tanto quanto naqueles tempos de Guerra Fria. Prova disso é o esvaziamento absoluto destas Marchas que foram convocadas em alguns locais, apesar de certo alvoroço nas redes virtuais. No entanto, precisamos todos estar muito atentos, pois há sempre grupos recorrendo a esquemas perigosos e defesa de princípios anti-democráticos. O nosso caminho deve ser o de mais emancipação, mais abertura política, mais aprimoramento dos espaços de participação etc. Qualquer proposta de retorno a um modelo autoritário de Estado deve ser convictamente rechaçada. E é importante entender que apesar de estarmos ainda distantes de um modelo pleno de democracia, o que vivenciamos já é algo bem melhor do que a experiência de um ambiente de exceção, de uma ditadura. E, principalmente, entender que a democracia é um valor, e a sociedade precisa buscar sua ampliação a cada dia. Tomemos um exemplo: mesmo décadas após termos encerrado a ditadura, a tortura e a execução ainda estão presentes na rotina da nossa polícia, a participação política ainda é muito restritiva. Além disso, há outros desafios que nos afligem: a miséria ainda se faz presente; o acesso precário a saúde e educação ainda é uma realidade. Não dá pra se pensar em democracia consolidada, sem extinguirmos esse tipo de condição.

O Prof. Bruno Moreira é professor de História do IFBA Campus Santo Amaro e mestre em História Social do Brasil pela UFBA.

Bom, essa foi mais uma entrevista, agradecer ao professor Bruno Moreira por topar participar e ainda discutindo sobre esse tema polemico que é a ditadura militar! Agora, deixe aqui suas redes sociais e contatos.

 

Email pra Contatobrunomoreira@ifba.edu.br

 

E ai galera, o que vocês acharam da nossa entrevista? Tem sugestões? Quem vocês acham que deveria aparecer por aqui? Entrem em contato!

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